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Sinteps questiona projeto destrutivo do governo sobre ensino técnico na rede: Interesses da iniciativa privada, precarização do trabalho docente e cursos de baixa qualidade. Vamos à luta em 13/6

Ainda em janeiro, pouco após a posse do governador Tarcísio de Freitas (Republicamos) e da indicação de Renato Feder à Secretaria de Educação do estado, declarações de ambos chamaram a atenção do Sinteps. Entre elas, a intenção do secretário, recém-chegado do Paraná, a bordo de graves de denúncias de sucateamento da rede daquele estado (clique para conferir matéria do Sindicato na época), de implantar ensino técnico nas escolas da rede paulista.

Em ofício à direção do Centro Paula Souza (Ceeteps), o Sinteps questionou a informação. Lembrando que “o Ceeteps é a instituição especializada em educação profissional, técnica e tecnológica há mais de 50 anos” e que isso nos tornou “referência na América Latina”, o documento solicitava reunião com o governador e respostas a duas questões centrais: “Qual é o projeto da sua gestão para o Ceeteps?”, “O Centro continuará a ser a instituição pública responsável pela oferta de ensino profissional, técnico e tecnológico a partir de 2024?”.

Em reunião com diretores do Sindicato, em 2/3, quando recebeu a pauta de reivindicações da categoria, a superintendente da instituição, professora Laura Laganá, confirmou que o Centro não teria participação direta nos objetivos declarados por Feder.

As respostas do governo não vieram. Já a intenção exposta nos primeiros dias de governo avançou para passos concretos. Notícias na imprensa mostram que o governo deve publicar, nos próximos dias, um decreto de reorganização da Secretaria Estadual de Educação (Seduc), com a criação da Coordenadoria de Educação Profissional, que será responsável por implantar e gerir o “novo modelo de ensino técnico” em São Paulo. Totalmente à margem do Centro Paula Souza, o modelo prevê a oferta de cursos técnicos dentro da estrutura atual das escolas da rede estadual, com cerca de 100 mil estudantes atendidos já em 2024 e previsão de até metade dos atuais cerca de 1,5 milhão de alunos do ensino médio até o final do mandato de Tarcísio, em 2026.

Trata-se de transformar um dos cinco itinerários formativos do “novo ensino médio” – o ensino técnico – em eixo central das escolas estaduais. O nome dado ao projeto é “Escolas Técnicas Próprias”.

Atualmente, as escolas da rede podem oferecer ensino técnico por meio do Novotec, programa criado na gestão João Doria, em que cursos técnicos do Centro passaram a ser ofertados dentro de escolas estaduais regulares. Embora não vá extinguir esse formato – cerca de 35.000 alunos estão matriculados – o governo Tarcísio já deixou clara a intenção de privilegiar as “escolas técnicas próprias”.

 

Cursos de estrutura barata e predominância generalista

Com números vistosos, a proposta de Tarcísio/Feder é enganosa. São previstos oito cursos possíveis: Administração, Vendas, Logística, Hotelaria e Hospedagem, Agronegócio, Farmácia, Enfermagem, Desenvolvimento de Sistemas, Ciência de Dados (experimental) e Educação Básica (experimental). Cada município escolherá os cursos, mas a disponibilidade está limitada a critérios como vocação socioeconômica regional, mercado de trabalho etc.

Como mostra o material divulgado pela Seduc, a esmagadora maioria dos cursos previstos, considerando-se todo o estado, concentra-se em Administração (601), Vendas (577), Educação Básica (395), Logística (227) e Agronegócio (213). Não por coincidência, são aqueles que exigem quase nenhum investimento em termos de equipamentos, laboratórios etc. 

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Precarização do trabalho: professores temporários terceirizados e notório saber

Em parecer sobre o projeto, o Conselho Estadual de Educação (CEE) alerta a Seduc de que a criação de novas escolas técnicas precisa levar em conta a escassez de professores qualificados para as modalidades.  "A contratação e formação de professores demandam tempo, recursos e uma infraestrutura adequada, fatores que devem ser levados em conta ao planejar a expansão do ensino técnico”, diz o documento.

A Seduc não entra nesse mérito e explica que, prioritariamente, serão escolhidos docentes que já atuam na rede, desde que atendam aos pré-requisitos de formação na área dos cursos técnicos. Já prevendo que este caminho suprirá uma pequena parte da demanda, informa que as vagas não preenchidas serão terceirizadas: uma empresa contratada pelo estado selecionará professores temporários. Também será possível a contratação de pessoal não docente, desde que com “notório saber”, conforme previsto na reforma do ensino médio. Sobre isso, é interessante conferir o artigo “Educação profissional e a reforma do ensino médio de 2017: financiamento e mercantilização da educação”, que tem Silvia Elena de Lima e Renato de Menezes Quintino, da diretoria do Sinteps, como coautores.

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Os docentes das “escolas técnicas próprias” passarão por formação também a cargo de “especialistas contratados” pela Seduc, com material igualmente terceirizado.

Os mercadores da educação – fornecedores de mão de obra, produtores de materiais de formação, agenciadores de especialistas – comemoram. Que grande filão se abre em São Paulo! As investidas de Feder no Paraná, à época em que foi secretário da educação, parecem fichinha diante do horizonte que surge no estado mais rico da federação. Em apenas um ano, Feder duplicou o número de vagas em ensino técnico no Paraná; em lugar de docentes, colocou aparelhos de TV nas salas, que transmitiam aulas produzidas por uma universidade privada (a Unicesumar). Após muitos protestos e denúncias, o governo paranaense teve que recuar e cancelar a modalidade. Ao que parece, as televisões foram deixadas de lado na investida em São Paulo pelo secretário, certamente mais experiente atualmente.

 

Parecer do CEE questiona alijamento do Centro

O parecer do CEE é bastante crítico em relação ao tratamento conferido pelo governo Tarcísio ao Centro Paula Souza. Lembrando que o Ceeteps é uma autarquia estadual, vinculada à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação, que está presente em 363 dos 645 municípios, e que administra 224 ETECs e 76 FATECs, com mais de 226 mil estudantes matriculados no Ensino Médio, Ensino Médio integrado ao Técnico e no Ensino Técnico, o CEE alerta:

“A proposta da Secretaria de Educação de criar uma nova coordenadoria para gerir as escolas técnicas precisa levar em conta que o Centro Paula Souza já desempenha essa função com qualidade, sem a necessidade de criar uma estrutura adicional, com cargos, salários e a exigência de desenvolver uma nova equipe.”

Em outro trecho, questiona o fato de que, ao fragmentar a gestão das escolas técnicas, corre-se o risco de perda de sinergia e de comprometimento da qualidade educacional. “O Centro Paula Souza possui equipes especializadas, com profissionais capacitados, que conhecem a realidade e as demandas das escolas técnicas. É fundamental que a SEDUC se organize para não duplicar esforços e valorize o trabalho e a experiência do CPS. É sensato concentrar esforços e investir na parceria com o CPS, fortalecendo suas equipes, incentivando a inovação e garantindo uma educação técnica de qualidade para os estudantes do estado. A instituição tem conhecimento profundo das necessidades desse tipo de ensino e sabe como preparar os profissionais para lidar com os desafios específicos dessa área.”

 

Esvaziamento das ETECs: meta histórica do projeto conservador no estado

Criado em 1969, o Centro Paula Souza recebeu ataques os mais diversos ao longo dos anos – como a reforma dos anos 90, durante o governo FHC –, sofreu e sofre com os investimentos insuficientes por parte do governo. As lutas de seus/suas trabalhadores/as e estudantes, como bem mostra a Revista Sinteps 20 anos, freou muitos destes ataques e contribuiu para que a instituição fosse crescendo e se fortalecendo como exemplo de rede pública de educação profissional.

Os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), exame realizado a cada dois anos, por exemplo, mostram que as ETECs mantiveram o desempenho de alto nível, apesar da pandemia de Covid-19. Como informa o site do Centro, a nota média das ETECs no Ideb em 2021 foi 5,9, índice superior à média do Ensino Médio no Brasil (4,2). Também é maior que o indicador obtido pelas escolas estaduais do País (3,9), pelas escolas públicas brasileiras (3,9) e pelas escolas privadas nacionais (5,6). As 10 melhores escolas públicas da capital paulista são ETECs. Entre as 50 melhores públicas do estado, 46 são unidades do Centro. Já a lista das 90 melhores escolas públicas do Brasil inclui 35 ETECs.

Graças ao empenho dos/das trabalhadores/as do Centro, as ETECs e FATECs são reconhecidas pela sociedade por sua excelência.

Os resultados são incontestáveis. Além de formar profissionais disputados no mercado de trabalho – nos níveis técnico e tecnológico – a inserção dos estudantes egressos das ETECs no ensino superior é impactante.

Mas isso não interessa aos governos conservadores que têm gerido o estado de São Paulo nas últimas décadas. Eles defendem um projeto político em que os filhos e as filhas dos trabalhadores não devem olhar para a formação superior, mas sim inserir-se no mercado de trabalho com funções medianas. E que a ciência e a tecnologia continuem sendo importadas dos grandes centros capitalistas.

 

Vamos à luta!

“O governo Tarcísio está iniciando um verdadeiro desmonte da educação profissional e técnica pública do estado de São Paulo”, frisa Renato de Menezes Quintino, vice-presidente do Sinteps.

Em vídeo no qual avalia o projeto anunciado para o ensino técnico na rede estadual, Renato alerta para o que está por trás das medidas: interesses graúdos da iniciativa privada e esvaziamento do Centro Paula Souza.

Ele conclama a categoria a somar forças na greve convocada pelo Sinteps para 13/6 e convida todos e todas, especialmente os/as que atuam na Grande SP, para o ato público em frente à administração do Centro às 14h (Rua dos Andradas, 140, Santa Ifigênia, SP): por reajuste, revisão da carreira, pagamento do bônus e defesa da educação profissional e técnica pública do estado de São Paulo.